LIVRO:
Ecos de londres: o investigador português em Inglaterra, jornal literário,
político, & c., nos primeiros anos da publicação, 1811-1813;
Autor:
Adelaide Maria Muralha Vieira Machado;
EDIÇÃO:
Lema d’Origem, Março de 2024, 134 p.
«A decisão da Comissão Liberato de impulsionar a publicação desta obra sobre os primeiros anos de O INVESTIGADOR PORTUGUEZ EM INGLA-TERRA (1811-1813) assentou na relevância que este periódico teve na vida de José Liberato Freire de Carvalho e vice-versa. De facto, embora Liberato só tenha entrado para a redacção do jornal em 1814, a sua acção nele foi de tal forma importante que as suas vidas e os seus nomes ficaram para sempre indissociáveis. Pode dizer-se que há um INVESTIGADOR antes e outro INVESTIGADOR após a chegada de José Liberato a Londres e ao jornalismo. Ora, para melhor conhecer e até compreender a vida, as ideias e a obra de José Liberato, pareceu-nos interessante dar ênfase e divulgar a "casa" que o recebeu, como nasceu o seu projecto e como cresceu e se consolidou, o contexto político e social cm que se afirmou, os seus redactores e financiadores, a importância crescente em ambos os reinos. Neste Julho de 1811, quando sai o primeiro número de O INVESTIGADOR, José Freire de Carvalho ainda não respondia por Liberato, antes era conhecido por D. José do Loreto, o nome que tinha adoptado quando fora admitido na Ordem dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, em Santa Cruz, Coimbra. O ano de 1811 foí muito acidentado para a vida de D. José do Loreto. No início do ano ainda estava refém e acompanhava o exército de Massena. Em Março, durante o combate de Foz de Arouce, tinha conseguido evadir-se e refugiar-se na casa do seu irmão em Ceira, sendo preso no dia seguinte pela polícia, suspeito de colaboração com os franceses. Seguiram-se dois meses de prisão na cadeia da Universidade e alguns, poucos, meses de liberdade até ser de novo enclausurado em Santa Cruz, às ordens do governo de Lisboa. Foi após esta clausura de cerca de dois anos (durante a qual traduziu os ANAIS de Tácito) que, nos finais de 1813, quando lhe preparavam uma deportação interna para outro convento agostinho, José aceitou ajuda da família Pinto Bastos e evadiu-se para Inglaterra, adoptando o nome de Liberato, honrando a sua própria libertação.
Graças ao seu perfil intelectual (professor, tradutor, bibliotecário) facilmente obteve uma ocupação condizente — redactor de O INVESTIGADOR PORTUGUEZ EM INGLATERRA, a que talvez não fossem estranhas as suas ligações maçónicas iniciadas em Lisboa pelos primeiros anos de 1800, quando se tornara o Spartacus da Loja "A Fortaleza"».
[Palavras Prévias, pela Comissão
Liberato, pp.9-10 – sublinhados nossos]
►«O aparecimento do Investigador não está oficializado por nenhum documento, mas sabe-se que partiu da iniciativa de Domingos António de Sousa Coutinho, embaixador de Portugal em Londres. Após uma primeira tentativa frustrada de entendimento com o redator do Correio Braziliense [Hipólito José da Costa (1774-1823) foi o redator do Correio Braziliense, 1808-1822, impresso em Londres], o futuro Conde e Marquês do Funchal [Domingos António de Sousa Coutinho (1760-1833), recebeu o título de Conde por serviços prestados à monarquia absoluta, e o título de Marquês por serviços prestados à causa liberal. In, Marques do Funchal, O Conde de Linhares, Lisboa, 1908] decidiu chamar a si a responsabilidade da criação de um novo jornal português em Inglaterra. Nesta tarefa foi assistido por dois exilados, sob a sua proteção: o médico Bernardo José de Abrantes e Castro, e Vicente Pedro Nolasco da Cunha, também médico, mas poeta por vocação
[Nolasco da Cunha (1773-1844) publicou na época, as seguintes obras: Jardim Botânico de Darwin, ou a economia da vegetação, poema com notas filosóficas, traduzido do inglês, Lisboa, 1803; O Tempo de Glória, Lisboa, 1802; O Triunfo da Natureza, Londres, 1809 (dedicado a Domingos Sousa Coutinho); O incêndio de Moscovo, ou a queda de Napoleão, Londres, 1812. No Investigador saíram também impressos, outros trabalhos do poeta, várias odes dedicadas a Filinto Elísio, ao Conde do Funchal e aos generais ingleses vitoriosos em Portugal, para além de traduções comentadas a trabalhos literários publicados na altura em Inglaterra]
e frequentador das suspeitas e perseguidas tertúlias literárias. Esta estranha associação de homens, conseguiu da corte no Brasil através do ministro D. Rodrigo, irmão do embaixador, a concessão de um número mínimo de assinaturas que garantia o financiamento do periódico.
Criado, perante a Corte, para combater os ataques ao governo feitos pelo Correio Brasiliense, defensor da independência do Brasil, seria esta a principal razão da obtenção do subsídio ministerial. […]
O Conde do Funchal, tal como os irmãos, fora afilhado de Pombal
crescera sob a sua proteção e mais tarde frequentara a Universidade reformada, onde teve os primeiros contactos com as
leituras do século ao privar com José
Anastácio da Cunha, a quem sempre admirou tanto quanto detestou os seus
algozes. Próximo dos círculos do poder, Domingos
António, fez carreira diplomática, completando a sua formação no contacto
com a cultura e política europeias. Acabaria por se fixar em Londres, como
embaixador, tornando-se um grande admirador das instituições e organização
política, inglesas.
O Conde do Funchal tentou ao longo da sua vida conciliar, nem sempre com sucesso, a devoção e real fidelidade à dinastia de Bragança, com a profunda admiração pela realidade inglesa. Daí o envolvimento com os exilados que por Londres passavam, e que acolhia sob a sua proteção. Em termos de política de estado alinhava com os Inglesados, embora a divisão entre estes e os Afrancesados
[A divisão entre Inglesados e Afrancesados passava pelas preferências a nível das alianças externas diplomáticas e comerciais. D. Rodrigo de Sousa Coutinho, futuro Conde de Linhares, era o chefe do partido inglês, António Araújo, futuro Conde da Barca o chefe do partido francês. Sobre o desenvolvimento deste assunto ver, Graça e J.S. da Silva Dias, Os Primórdios da Maçonaria em Portugal, Vol. 1, Tomo II, pp. 421-450].
tivesse perdido a funcionalidade após as invasões francesas e a ida da corte para o Brasil sob escolta inglesa. No entanto, as famílias ou grupos de expressão e as rivalidades delas provenientes, ainda se mantiveram operativos durante algum tempo, em consonância com a composição dos gabinetes de estado. Convém referir, que esta divisão se limitava aos círculos de poder, sem ramificações organizativas ou ideológicas no país, tal como as concebemos, por exemplo, para o período seguinte entre absolutistas e liberais […]
[Adelaide Maria Muralha Vieira Machado, Ecos de Londres …, pp-93-94 – sublinhados nossos]
J.M.M.
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