domingo, 24 de março de 2024

ECOS DE LONDRES: O INVESTIGADOR PORTUGUÊS EM INGLATERRA, JORNAL LITERÁRIO, POLÍTICO, & C., NOS PRIMEIROS ANOS DA PUBLICAÇÃO, 1811-1813

 


LIVRO: Ecos de londres: o investigador português em Inglaterra, jornal literário, político, & c., nos primeiros anos da publicação, 1811-1813;
Autor: Adelaide Maria Muralha Vieira Machado;
EDIÇÃO: Lema d’Origem, Março de 2024, 134 p.

«A decisão da Comissão Liberato de impulsionar a publicação desta obra sobre os primeiros anos de O INVESTIGADOR PORTUGUEZ EM INGLA-TERRA (1811-1813) assentou na relevância que este periódico teve na vida de José Liberato Freire de Carvalho e vice-versa. De facto, embora Liberato só tenha entrado para a redacção do jornal em 1814, a sua acção nele foi de tal forma importante que as suas vidas e os seus nomes ficaram para sempre indissociáveis. Pode dizer-se que há um INVESTIGADOR antes e outro INVESTIGADOR após a chegada de José Liberato a Londres e ao jornalismo. Ora, para melhor conhecer e até compreender a vida, as ideias e a obra de José Liberato, pareceu-nos interessante dar ênfase e divulgar a "casa" que o recebeu, como nasceu o seu projecto e como cresceu e se consolidou, o contexto político e social cm que se afirmou, os seus redactores e financiadores, a importância crescente em ambos os reinos. Neste Julho de 1811, quando sai o primeiro número de O INVESTIGADOR, José Freire de Carvalho ainda não respondia por Liberato, antes era conhecido por D. José do Loreto, o nome que tinha adoptado quando fora admitido na Ordem dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, em Santa Cruz, Coimbra. O ano de 1811 foí muito acidentado para a vida de D. José do Loreto. No início do ano ainda estava refém e acompanhava o exército de Massena. Em Março, durante o combate de Foz de Arouce, tinha conseguido evadir-se e refugiar-se na casa do seu irmão em Ceira, sendo preso no dia seguinte pela polícia, suspeito de colaboração com os franceses. Seguiram-se dois meses de prisão na cadeia da Universidade e alguns, poucos, meses de liberdade até ser de novo enclausurado em Santa Cruz, às ordens do governo de Lisboa. Foi após esta clausura de cerca de dois anos (durante a qual traduziu os ANAIS de Tácito) que, nos finais de 1813, quando lhe preparavam uma deportação interna para outro convento agostinho, José aceitou ajuda da família Pinto Bastos e evadiu-se para Inglaterra, adoptando o nome de Liberato, honrando a sua própria libertação.

Graças ao seu perfil intelectual (professor, tradutor, bibliotecário) facilmente obteve uma ocupação condizente — redactor de O INVESTIGADOR PORTUGUEZ EM INGLATERRA, a que talvez não fossem estranhas as suas ligações maçónicas iniciadas em Lisboa pelos primeiros anos de 1800, quando se tornara o Spartacus da Loja "A Fortaleza"».

[Palavras Prévias, pela Comissão Liberato, pp.9-10 – sublinhados nossos]

 


►«O aparecimento do Investigador não está oficializado por nenhum documento, mas sabe-se que partiu da iniciativa de Domingos António de Sousa Coutinho, embaixador de Portugal em Londres. Após uma primeira tentativa frustrada de entendimento com o redator do Correio Braziliense [Hipólito José da Costa (1774-1823) foi o redator do Correio Braziliense, 1808-1822, impresso em Londres], o futuro Conde e Marquês do Funchal [Domingos António de Sousa Coutinho (1760-1833), recebeu o título de Conde por serviços prestados à monarquia absoluta, e o título de Marquês por serviços prestados à causa liberal. In, Marques do Funchal, O Conde de Linhares, Lisboa, 1908] decidiu chamar a si a responsabilidade da criação de um novo jornal português em Inglaterra. Nesta tarefa foi assistido por dois exilados, sob a sua proteção: o médico Bernardo José de Abrantes e Castro, e Vicente Pedro Nolasco da Cunha, também médico, mas poeta por vocação

[Nolasco da Cunha (1773-1844) publicou na época, as seguintes obras: Jardim Botânico de Darwin, ou a economia da vegetação, poema com notas filosóficas, traduzido do inglês, Lisboa, 1803; O Tempo de Glória, Lisboa, 1802; O Triunfo da Natureza, Londres, 1809 (dedicado a Domingos Sousa Coutinho); O incêndio de Moscovo, ou a queda de Napoleão, Londres, 1812. No Investigador saíram também impressos, outros trabalhos do poeta, várias odes dedicadas a Filinto Elísio, ao Conde do Funchal e aos generais ingleses vitoriosos em Portugal, para além de traduções comentadas a trabalhos literários publicados na altura em Inglaterra]

e frequentador das suspeitas e perseguidas tertúlias literárias. Esta estranha associação de homens, conseguiu da corte no Brasil através do ministro D. Rodrigo, irmão do embaixador, a concessão de um número mínimo de assinaturas que garantia o financiamento do periódico.

Criado, perante a Corte, para combater os ataques ao governo feitos pelo Correio Brasiliense, defensor da independência do Brasil, seria esta a principal razão da obtenção do subsídio ministerial. […]

O Conde do Funchal, tal como os irmãos, fora afilhado de Pombal crescera sob a sua proteção e mais tarde frequentara a Universidade reformada, onde teve os primeiros contactos com as leituras do século ao privar com José Anastácio da Cunha, a quem sempre admirou tanto quanto detestou os seus algozes. Próximo dos círculos do poder, Domingos António, fez carreira diplomática, completando a sua formação no contacto com a cultura e política europeias. Acabaria por se fixar em Londres, como embaixador, tornando-se um grande admirador das instituições e organização política, inglesas. 

 

O Conde do Funchal tentou ao longo da sua vida conciliar, nem sempre com sucesso, a devoção e real fidelidade à dinastia de Bragança, com a profunda admiração pela realidade inglesa. Daí o envolvimento com os exilados que por Londres passavam, e que acolhia sob a sua proteção. Em termos de política de estado alinhava com os Inglesados, embora a divisão entre estes e os Afrancesados

[A divisão entre Inglesados e Afrancesados passava pelas preferências a nível das alianças externas diplomáticas e comerciais. D. Rodrigo de Sousa Coutinho, futuro Conde de Linhares, era o chefe do partido inglês, António Araújo, futuro Conde da Barca o chefe do partido francês. Sobre o desenvolvimento deste assunto ver, Graça e J.S. da Silva Dias, Os Primórdios da Maçonaria em Portugal, Vol. 1, Tomo II, pp. 421-450].

tivesse perdido a funcionalidade após as invasões francesas e a ida da corte para o Brasil sob escolta inglesa. No entanto, as famílias ou grupos de expressão e as rivalidades delas provenientes, ainda se mantiveram operativos durante algum tempo, em consonância com a composição dos gabinetes de estado. Convém referir, que esta divisão se limitava aos círculos de poder, sem ramificações organizativas ou ideológicas no país, tal como as concebemos, por exemplo, para o período seguinte entre absolutistas e liberais […]

[Adelaide Maria Muralha Vieira Machado, Ecos de Londres …, pp-93-94 – sublinhados nossos]

J.M.M.

domingo, 17 de março de 2024

O 25 DE ABRIL, A FORÇA DOS SÍMBOLOS – POR ANTÓNIO VALDEMAR

 


O 25 DE Abril, a força dos símbolos” – por António Valdemar, in Tempo Livre

 Portugal ficou diferente. Falta muito para o desejável. Mas faltará sempre, aqui e em outros países democráticos, que enfrentam os problemas atuais e procuram articulá-los com os grandes desafios do futuro

Tudo aconteceu há 50 anos. Rompeu através da madrugada e ganhou uma energia extraordinária através de todo o dia. A apoteose decorreu no 1.º de Maio. A Liberdade era restituída, em 25 de Abril, com a poesia e a música de José Afonso, sem recorrer aos tiros dos canhões e das espingardas. Nas ruas de Lisboa, e um pouco por todo o país, os cravos vermelhos logo se transformaram num dos símbolos vivos da revolução. Constituiu o ponto final de 50 anos de ditadura imposta por Salazar, seguida por Marcello Caetano. A poesia, a música e as artes plásticas registaram testemunhos impressionantes da prisão, da tortura, do exílio e da saga da resistência. A Ode à Liberdade de Jaime Cortesão insistia no repúdio ao «ódio fanático dos bonzos», ao «ciúme vil dos fariseus». Para louvar «a cada novo dia e duro preço», o «sopro e a lei da criação». Era a exortação para transpor a incerteza, a violência, a desigualdade e estabelecer uma cultura de justiça, de tolerância e diálogo.

Outro poeta, Sidónio Muralha, não podia sufocar este protesto veemente: «Já não há mordaças, nem ameaças,/ nem algemas que possam impedir/ a nossa caminhada,/ em que os poetas são os próprios versos dos poemas.» Ou, então, o clamor de Prometeu, recriado por Joaquim Namorado: «Abafai-me os gritos com mordaças,/ maior será a minha ânsia de gritá-los; /amarrai-me os pulsos com grilhetas,/ maior será a minha ânsia de quebrá-las;/ rasgai a minha carne, triturai os meus ossos,/ o meu sangue será a minha bandeira;/ meus ossos o cimento de uma outra humanidade, /que aqui ninguém se entrega./ Isto é vencer ou morrer!»

Jorge de Sena, do outro lado do mar enviava este poema repleto de angústia e alguma esperança. «Eu não posso senão ser/ desta terra em que nasci. /Embora ao mundo pertença /e sempre a verdade vença, /qual será ser livre aqui, /não hei-de morrer sem saber. / Trocaram tudo em maldade, /É quase um crime viver./ Mas, embora escondam tudo/ e me queiram cego e mudo, /Não hei-de morrer sem saber/ Qual a cor da liberdade

Sophia de Mello Breyner viveu e celebrou em Lisboa o 25 de Abril. Em plena revolução deslocou-se a Caxias para acompanhar a libertação dos que estiveram privados de liberdade. Resumiu num poema – ilustrado por Vieira da Silva – que ficou a ser uma referência obrigatória: «Esta é a madrugada que eu esperava /O dia inicial inteiro e limpo /Onde emergimos da noite e do silêncio/E livres habitamos a substância do tempo.»

O programa do 25 de Abril anunciou – e cumpriu – a reposição das liberdades reprimidas e castigadas durante meio século; o início da descolonização possível; a oportunidade para concretizar as regras constitucionais que fundamentam um Estado de Direito. Milhares e milhares de portugueses e suas famílias encontravam-se dilacerados pela crueldade da guerra colonial, em três frentes de combate: o espectro da morte, os pressentimentos, as insónias, os pesadelos que nunca mais esquecem.

Os poemas escaldantes de Manuel Alegre tornaram-se a voz da nossa própria voz: «Foram dias foram anos a esperar por um só dia. /Alegrias. Desenganos. Foi o tempo que doía /Com seus riscos e seus danos. Foi a noite e foi o dia /Na esperança de um só dia. Foram batalhas perdidas. Foram derrotas e vitórias./Foi a vida (foram vidas). Foi a História (foram histórias) / Mil encontros despedidas. Foram vidas (foi a vida) /Por um só dia vivida./ (…) Fogos-fátuos cinza fria. Musa minha que cantavas /A canção que se vestia com bandeiras nas palavras: /Armas que o tempo tecia. Minha vida toda a vida / Por um só dia vivida.»

No romance Os Memoráveis, Lídia Jorge recriou testemunhos de intervenientes da revolução e, ao mesmo tempo, os efeitos da passagem do tempo, não só acerca desses protagonistas, mas dos que se evidenciaram na sociedade contemporânea. Caracterizam a grandeza e as misérias dos portugueses, no dia-a-dia, e, em momentos históricos. Dir-se-iam que permanecem como sobreviventes de um tempo já inalcançável.

A leitura dos Memoráveis conduz-nos à ilusão revolucionária, à desilusão de muitos e à travessia para conseguir a plenitude da democracia. A exaltação e o ceticismo destacam-se, invariavelmente na poesia, nos Diários, nos contos, novelas e romances de Miguel Torga.

É o homem sempre irritado, receoso, sombrio, ressabiado, cujo mundo reside, apenas, nele próprio. Basta ler e refletir na posição assumida, em 1976, num discurso sobre o 25 de Abril, proferido em Arganil: «Hora angustiosa que nada fazia prever em Abril de setenta e quatro, quando uma manhã de esperança raiou no espírito de todos nós. Depois de meio século de negrura, o sol da liberdade brilhou inesperadamente em Portugal. E foi, como sabeis, uma festa universal. Depressa, porém, a tristeza voltou.

E a palavra revolução, acolhida com benevolência até nos ouvidos, mais refractários, em vez de, como outrora, significar uma rotura promissora e fecunda, passou a evocar apenas a desordem à solta nas ruas, e o arbítrio e a prepotência, ensarilhados na parada dos quartéis. Creio que nenhum português consciente esquecerá até ao fim dos seus dias estes dois anos aziagos. Enganada na sua boa fé, a alma da Nação foi durante eles indelével e dolorosamente tatuada por todos os estigmas da desgraça

Qualquer que seja a avaliação o 25 de Abril cerrou as grades das prisões políticas de Caxias, do Aljube e de Peniche. Promoveu a formação de partidos, de pluralismo de opinião e de crítica. Ao procedermos a um balanço sumário verificamos acidentes de percurso. Todavia, a Constituição da República, estabeleceu as regras do exercício do Estado de Direito e a enumeração dos objetivos fundamentais para o combate inadiável à rotina e ao pensamento único; para reclamar os imperativos da mudança, incutir a exigência de responsabilidade ética, estimular a ousadia e a inovação para a transformação do País, mergulhado em estruturas arcaicas.

Concretizou-se o programa do 25 de Abril, anunciado nessa madrugada histórica. Houve, de imediato, a restituição das liberdades. Realizou-se a integração na Europa. Falta muito para atingir o desejável, mas faltará sempre, aqui e em outros países livres e democráticos, que dentro dos condicionalismos inevitáveis enfrentam os problemas atuais e procuram articulá-los com os grandes desafios para o futuro.

O 25 DE Abril, a força dos símbolos – por António Valdemar [Jornalista e investigador, membro da Classe de Letras da Academia das Ciências] – in Tempo Livre Março/ Abril de 2024, p. 8 – com sublinhados nossos; FOTO de Álvaro Carrilho.

J.M.M.

quarta-feira, 6 de março de 2024

JOÃO DE DEUS - VIDA, POR JOSÉ ALBERTO QUARESMA

 

No próximo dia 8 de Março de 2024, no âmbito das Comemorações dos 194 anos do Nascimento de João de Deus, vai ser apresentada a obra de José Alberto Quaresma, João de Deus - Vida.

A sessão vai realizar-se no Auditório Francisco Vargas Mogo, em São Bartolomeu de Messines, concelho de Silves, pelas 18 horas.

Vai apresentar a obra o Professor Doutor José António Gomes e conta ainda com a presença da Presidente da Câmara Municipal de Silves, Rosa Palma.

A edição está a cargo da Imprensa Nacional - Casa da Moeda e pode ser consultada para mais informações na página da editora AQUI.


Pode ler-se na Nota de divulgação da obra:

A caminho dos 200 anos, João de Deus continua vivo na alma da nação. Em passinho seguro e certo, merece calcorrear as veredas do silêncio para um futuro distante. Avantajar-lhe os anseios deve ser imperativo de progresso, centrado na pessoa, em benefício de toda a humanidade. A ação de João de Deus prolonga-se por quatro gerações, cruzando três centúrias. É uma das maiores obras de civilização no Portugal dos pequeninos e dos grandes. O seu legado segura-se. O ser humano que nos espevita a inteligência e amolece a alma, pela sua grandeza espiritual, continua a surpreender-nos. O João de Deus que por estas páginas se deixa entreaberto, bem se quer que continue a medrar noutra qualquer aventura do conhecimento, da literatura ou das artes. Urge destapar, avivar, recriar e expandir a sua herança. Tanto mais não seja para derramar um pouco de indulgência e sabedoria pelos dias turvos. Os menos favorecidos pela fortuna deverão continuar a ser os destinatários da sua luz. Os outros, tal-qualmente. João de Deus a todos pertence.

Com os votos do maior sucesso!!

A.A.B.M.