terça-feira, 8 de março de 2011

JOSÉ CARLOS RATES (Parte II)


Nos primeiros tempos do Partido Comunista, a influência da Internacional Comunista era notória e o secretário-geral era imposto pelo delegado, que nessa época era Jules Humbert-Droz. Foi assim que após a criação da primeira Junta Nacional, ainda em 1921, que era secretariada por H. Caetano de Sousa e constituída por Alberto Júlio das Neves, Bernardino dos Santos, Fernando Barbosa e João Nascimento Cunha.

Em 1920 e 1921, Carlos Rates, à data um federalista convicto, assina um conjunto de artigos que publica no jornal Pátria, dirigido por Nuno Simões, tendo sido o jornalista destacado para a cobertura do I Congresso Municipalista Algarvio, realizado em 26 e 27 de Setembro de 1920, na Sala de Sessões da Junta Geral do Distrito e por iniciativa de João Rodrigues Aragão.

Em finais de 1922, Caetano de Sousa, secretário-geral do novo partido, parte para Moscovo, chefiando uma delegação que participa no IV Congresso da Internacional Comunista (IC), realizado a 5 de Novembro de 1922. No seu regresso estala uma grave crise no partido. A situação só será resolvida com a realização do 1º Congresso, a 10-12 de Novembro, em Lisboa, onde se faz sentir novamente a influência do delegado da IC, Jules Humbert-Droz, que impõe Carlos Rates como secretário-geral, ordena a expulsão Caetano de Sousa e suspende José de Sousa por seis meses. Acompanhavam o secretário-geral, no Comité Central, Francisco Rodrigues Loureiro, Grácio Ramos, António Rodrigues Graça, Alberto Monteiro, Salvaterra Júnior e Raul Lavado.

Este I Congresso do PCP - fundado em 6 de Março de 1921, em Assembleia-geral, realizada na Associação dos Empregados de Escritório em Lisboa - realiza-se entre 10 a 12 de Novembro de 1923, em Lisboa. Nele participam já 90 delegados representando 27 organizações. As teses, tinham sido publicadas antecipadamente em O Comunista e previamente debatidas nas estruturas do partido. O então secretário-geral, José Carlos Rates, apresentou o relatório do Comité Executivo, e o Congresso aprovou uma Resolução sobre a organização, os Estatutos, o Programa de Acção e uma Resolução sobre a Questão Agrária.
Entre as orientações saídas do I Congresso, destaque para a reclamação que " o camponês detenha a terra que possa fazer frutificar com o seu braço" e das 8 horas de trabalho para os trabalhadores rurais assalariados. O I Congresso apontou o perigo do fascismo e salientou a importância da unidade da classe operária para o derrotar e manifestou a sua solidariedade para com os comunistas e sindicalistas presos pelo governo.

O jornal do partido, O Comunista, retoma a sua publicação em Maio de 1923, com Carlos Rates como "redactor principal" e transcrevendo artigos ou citações dos clássicos, de Lenine, Trotsky, Zinoviev e outros ideólogos do comunismo internacional. Nos editoriais do jornal procurava estabelecer-se, no plano teórico, o que será a sociedade comunista e procuram-se clarificar os princípios do comunismo distinguindo-os do anarquismo. Propugna-se para Portugal, no imediato, um governo operário-camponês que previna a ascensão do fascismo.

Em 1924, Carlos Rates desloca-se a Moscovo para assistir ao IV Congresso da Internacional Comunista, realizado em Julho. Porém, observa-se uma situação algo estranha, porque o representante oficial do Partido Comunista Português era Jules Humbert-Droz, provocando uma cisão com Carlos Rates, que não iniciou o processo de bolchevização do partido, conduzindo-o para o leninismo, um partido de tipo novo, proletário e revolucionário.

Carlos Rates advoga uma aliança com o Partido Radical e a Esquerda Democrática de Domingues dos Santos, acabando por ser expulso do partido, por desviacionismo às directivas políticas da Internacional, no 2º Congresso do PCP, em Maio de 1926. Este congresso, realizado em 29 e 30 de Maio de 1926, acaba por não terminar, criando um vazio na direcção e conduzindo a um quietismo e ausência de força que permite a chegada do General Gomes da Costa sem grandes obstáculos por parte do movimento operário. Tudo indica que o PCP ainda tentou organizar uma frente comum do proletariado contra o perigo do avanço de uma ditadura seguindo o modelo fascista, sobretudo através da acção do jornal A Batalha.

Manuel Ferreira Quartel entra em conflito com Carlos Rates, após a sua saída do Partido Comunista. A este propósito publica um extenso e violento artigo no jornal A Internacional, onde denuncia todo o conjunto de manobras utilizadas por Rates.

[A continuar.]
A.A.B.M.

2 comentários:

Carlos Gomes disse...

À altura da implantação da Ditadura Militar em 1926, o PCP não constituía uma força capaz de levantar qualquer obstáculo significativo por duas razões principais: era ainda um partido pouco expressivo no movimento operário ainda sob uma forte influência do anarco-sindicalismo que, de resto, detinha a liderança da esmagadora maioria dos sindicatos. Por outro lado, o movimento militar então surgido constituiu inclusive para muitos sectores republicanos, uma esperança de redenção do próprio regime republicano, afastando a influência nefasta do Partido Democrático de Afonso Costa e procurando reabilitar as finanças e a economia.
O facto é que, simpatize-se ou não, o movimento militar teve uma forte adesão popular incluindo em sectores ligados à Primeira República, tendo sido antecedido pelo aparecimento de diversos grupos de reflexão com referência a diferentes quadrantes políticos e ideológicos, do qual destaco a Seara Nova e o Integralismo Lusitano.
Qualquer semelhança com os tempos que actualmente vivemos é pura coincidência...

Carlos Gomes disse...

O movimento operário em Portugal encontra-se envolto em inúmeros mitos que não permitem ainda uma visão histórica descomprometida e devidamente distanciada. Convém lembrar que, quando em 1926, foi desencadeado o movimento militar que viria a estabelecer a ditadura militar, o PCP contava apenas com cinco anos de existência e estava ainda muito longe de ser aquilo que actualmente representa. De resto, em 1938, Dimitrov promoveu a sua expulsão da III Internacional, entre outros aspectos devido à sua fraca representatividade e estrutura orgânica.
Pelo contrário, a implantação do anarco-sindicalismo no movimento operário foi tão profunda que, mesmo após o golpe de misericórdia que lhe foi infligido em 18 de Janeiro de 1934 ou, para sermos mais correctos, com a aprovação da legislação sobre os sindicatos e a própria Constituição de 1933, a cultura anarco-sindicalista permaneceu no movimento operário até bem recentemente. A recusa do partido enquanto vanguarda de classe, constituiu desde sempre uma atitude dos trabalhadores que sempre procuraram manter os partidos afastados das suas lutas. E, o caso mais exemplar foi a célebre manifestação de trabalhadores da Lisnave em 1974!