sábado, 6 de março de 2021

CHRONICA DO ALGARVE, FARO, 1833


CHRONICA DO ALGARVE - Ano I, nº 1, 15 de Julho de 1833 ao nº 3, 20 de Julho de 1833; Direc. Manuel António Ferreira Portugal (Diretor da Imprensa do Governo); Redacção: Rua do Aljube, nº 998; Impressão: Imprensa do Governo, Faro.

Durante bastante tempo pouco se conhecia sobre este primeiro periódico que se publicou na região algarvia. A Hemeroteca Digital do Algarve permitiu a sua localização e disponibilização ao público em formato digital.

A Chronica do Algarve, publicou-se em Faro, em 1833, tendo o primeiro número sido publicado em 15 de Julho desse ano, conforme se pode ver na imagem acima. A publicação de um periódico na região já devia ser uma pretensão das elites dirigentes, que estavam a assumir as funções e a estabilizar o poder dos liberais quando, no resto do País, ainda havia convulsões e travavam-se combates entre os apoiantes de D. Pedro e de D. Miguel. 

José Vieira Branco, antigo tipógrafo e militar, procurou com pouco sucesso descobrir mais informações sobre a fundação do jornal em Faro. Cerca de meio século mais tarde, José Carlos Vilhena Mesquita tentou também, ainda com a ajuda e o conhecimento de Mário Lyster Franco, descobrir mais alguma informação sobre o jornal e chegou a publicar um artigo, num dos primeiros congressos regionais do Algarve em 1984 [José Carlos Vilhena Mesquita, «CHRONICA DO ALGARVE» TERÁ SIDO O PRIMEIRO JORNAL ALGARVIO?, 3º Congresso sobre o Algarve, vol. 1, Silves, Racal Clube, 1984 disponível AQUI]. Porém, foi com a concretização do projeto da Hemeroteca Digital do Algarve que se conseguiu juntar dois dos números do jornal que se publicaram, bem como alguns suplementos.

O jornal apresentava em nota, no canto superior esquerdo, que devia publicar-se às quartas-feiras e sábados. No entanto, o número um publicou-se a uma segunda-feira. Sem qualquer outra simbologia além da coroa do poder real em epígrafe, referia o preço de venda por exemplar (40 réis por número) e o preço dos suplementos (20 réis). Colocava ainda um excerto do Canto X, de Os Lusíadas, de Luís Vaz de Camões. O jornal, como era padrão naquela época, tinha quatro páginas a duas colunas e, sintomaticamente, serviu de forma objetiva para propagandear as vitórias liberais face aos confrontos com as tropas miguelistas.

A organização interna deste órgão da imprensa escrita começava com uma apresentação, intitulada de prospecto, onde se destacavam as finalidades a que se propunha o periódico: "Empenhados em defender a Causa da Honra, e da Legitimidade do Trono, e das Liberdades Pátrias", "Diremos com a ingenuidade própria de um verdadeiro liberal tudo o que ocorrer de notável nas operações da expedição, destinada a quebrar as algemas, que manietavam os pulsos dos fiéis Portugueses neste reino, e província limítrofe" e concluía "Daremos as peças oficiais, e escreveremos lambem o que houver de notável na heroica cidade do Porto, apenas dali recebermos as noticias; e com algumas dos reinos estrangeiros que mais possam Interessar á nossa Causa, encheremos este limitado periódico, em que não tem parte a especulação e interesse pecuniário (que a todo e qualquer renunciamos desde já), mas somente o desejo de ser úteis a nossos honrados hóspedes e concidadãos, e de os esclarecermos sobre a opinião geral do Reino e da Europa, que por certo é a parte mais civilizada do mundo". Seguiu-se depois uma extensa nota, na Parte Não Oficial, sobre a Expedição ao Algarve e concluía essa parte com algumas das proclamações feitas na cidade do Porto, neste caso uma proclamação de D. Pedro e outra do Conde Vila Flor.

Na quarta, e última página, em género de pequeno anúncio, fica-se a saber que o diretor do periódico era Manuel António Ferreira Portugal e que estavam reservadas pequenas vantagens para os assinantes do bissemanário, pagariam menos 10 réis por número do que o público normal e a publicação estava disponível para receber anúncios com preços a combinar. Sobre esta figura pouco se sabe também, mas abaixo aditar-se-á mais alguns elementos biográficos que se conseguiram reunir.

A imprensa utilizada para imprimir a Chronica do Algarve era a Imprensa do Governo, que estava estabelecida na Rua do Aljube (depois Rua do Município) em Faro, 998.

Manuel António Ferreira Portugal era bastante jovem quando foi desafiado a estabelecer-se no Algarve com uma oficina tipográfica. 

Em Outubro de 1833, sabemos que vai ser apontado para criar uma tipografia portátil para acompanhar o exército, solicitando-se mesmo a aquisição de utensílios e equipamentos necessários ao seu funcionamento. Seria já funcionário da Imprensa Nacional e seria dispensado para acompanhar a Tipografia do Exército em operações (1).  Alfredo da Cunha, na sua estimada obra sobre o "Diário de Notícias" diz-nos que Ferreira Portugal foi o representante do jornal de anúncios "Gratis" (1836-1857). Sabe-se que, em 1844, Ferreira Portugal já se encontra estabelecido com uma tipografia em Lisboa (Calçada dos Barbadinhos, Santa Apolónia) e que terá sobrevivido pelo menos até 1867. Nessa tipografia foram impressas entre outras as seguintes publicações:

O Director, Lisboa, Tipografia de M. A. F. Portugal, 1838-1840.
Almanak estatistico de Lisboa em 1841 [a 1853] / coordenado por M.A.F. Portugal, [Lisboa?] : Typographia do Gratis, 1841.
- O Correio Português, ed. M.A.F. Portugal, Lisboa, 01-12-1841 a 31-12-1845, nº 1127
A Restauração. Lisboa: Typ. de M.[anuel] A.[ntónio] F.[erreira] Portugal,  25.5.1842;
O Estandarte, Lisboa, 02-08-1847 a  22-11-1851;
- O Conservador, Lisboa, 15-09-1851 a 14-02-1852;

Tomás Quintino Antunes, que virá a ser chefe da tipografia do Diário de Notícias descrevia num breve apontamento Manuel António Ferreira Portugal descrevia-o assim:

homem grosseiro e irascível, que mal conhecia os processos tipográficos, e não tinha outros merecimentos senão o ter servido como soldado no batalhão dos Voluntários da Rainha durante a guerra da restauração constitucional. Orgulhoso e vingativo, tudo lhe servia de pretexto para tratar os empregados como uma  horda de escravos, sem mesmo poupar os que, por seus longos serviços, e pela sua avançada idade, tinham incontestável direito a serem tratados com a maior consideração (2). 

(1) https://imprensanacional.pt/history-heritage/sobre-o-fornecimento-de-utensilios-para-a-organizacao-de-uma-imprensa-portatil-para-o-quartel-general-imperial/?fbclid=IwAR1FjYd1Q9MgyQtCgGDmmxsXwLgbFfnx4M1FOFn5GVcklCJyPSYXe0_pEbs

(2) Cunha, Alfredo da, Diário de Notícias. Sua Fundação e os fundadores. Alguns factos para a História do Jornalismo Português, Lisboa, Diário de Notícias, 1914p. 78 também disponível online  aqui: http://hemerotecadigital.cm-lisboa.pt/EFEMERIDES/diariodenoticias/DiariodeNoticias.pdf

A.A.B.M.

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