Sebastião José Ribeiro [1894-1979] foi republicano e socialista
(segundo o próprio), um opositor (muito próximo de Cunha Leal) à ditadura e ao
Estado Novo, revelando um espírito combativo, porém indisciplinado, tendo-nos
deixado, na sua faceta de panfletário implacável e obstinado, um vasto conjunto
de livros e opúsculos (de importância memorialista), repleto de aspectos muito
curiosos.
Veja-se só esta pérola sobre o “génio do século” [assim escrito
por S. Ribeiro, citando Marcelo Caetano], o ditador Salazar, seu companheiro de
Curso na Universidade de Coimbra:
“… Conheci Salazar em Coimbra. Frequentávamos a faculdade de
direito, ele, mais antigo, caminhava pelo período transitório; e nós, mais
modernos, abrimos a reforma de 1911. Avesso a expansões, Salazar convivia pouco
com os camaradas. Entrou na universidade de aspecto grave, munido do curso
completo do seminário, desprovido das últimas ordens, talvez se podendo dizer
padre mal acabado. Como oportunamente explicou, desistiu do sacerdócio, porque,
fora dele, servia melhor a igreja, na parte política queria ele significar,
duvidosa como trazia a crença. Cursando o período transitório e formado como os
outros em menos de cinco anos, saiu um prematuro bacharel em direito. Mais
tarde, resolveu tentar a entrada no corpo docente da universidade. Procurou,
com êxito, escalar a cátedra por via do grupo de cadeiras mais fáceis á
aventura premeditada (… ) Aberto concurso para o grupo de cadeiras económicas,
concorreu Salazar, sem competidor a fazer-lhe sombra. Apresentou-se desprovido
da conveniente preparação, caso estranho para mim, porque, seja dito em abono
da verdade, Salazar foi um aluno aplicado, embora desprovido de facilidade de
exposição. Capaz de reproduzir, expunha sem originalidade, e era avesso a
qualquer discussão …” [in “Anotações do Presente, vol II, p. 69-70 – delicioso e
contundente livro-parecer sobre Salazar, o Estado Novo e as figuras do regime]
Exerceu profissionalmente as funções de advogado, assumindo
também a magistratura, como delegado do procurador da República e juiz, em
diversas comarcas do continente e colónias,
Sebastião Ribeiro nasce em Podence (Macedo de Cavaleiros) a 14
de Janeiro de 1894 [cf. Enciclopédia Luso-Brasileira]. Era filho do juiz
Salvador Ribeiro e de Beatriz Ernestina Carneiro e sobrinho de António Máximino
Carneiro, chefe poderoso do Partido Democrático em Valpaços. Depois dos seus
estudos liceais ingressa na Universidade de Coimbra (em 1911, na nova reforma),
onde se forma em Direito (6 de Dezembro de 1916). Vai exercer a advocacia para
Resende (Viseu). Ai foi sub-delegado do procurador da República e,
posteriormente, notário interino em Valpaços [cf. Sebastião Ribeiro,
“Recordações do Passado”, 1967 – livro apreendido pela PIDE].
Com a investida monárquica (traulitânea ou monarquia do norte) vai
procurar refúgio em Valpaços, onde pontificava o seu tio, o republicano
Máximino Carneiro, aderindo à coluna de voluntários republicanos, que
caminhavam para a defesa de Chaves. Em Chaves, para onde se desloca, encontra
alguns republicados amigos, o dr. Gualter Rodrigues, o médico Júlio Martins, o
comandante Agatão Lança, tendo conhecido António Granjo, o coronel Ribeiro de
Carvalho, e outros mais, como nos relata no seu curioso livro, “Recordações do
Passado”.
Com a ditadura de Sidónio Pais foi demitido das suas funções
[ibidem]. Depois de ter concorrido a concurso público, foi nomeado delegado do procurador
da República para a comarca de Portel (Évora), em Outubro de 1919, tendo ali
permanecido, apenas, durante um mês, por “impossibilidade de levar a bom termo
a minha acção, por falta de juiz” [assim o refere, ibidem, p. 31]. Regressa a
Lisboa com a ideia de ir trabalhar para África, tal era o seu desejo de
conhecer aqueles territórios.
[A CONTINUAR]
J.M.M.
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