VIDA CONTEMPORÂNEA. Revista Mensal de Estudos Económicos, Financeiros,
Sociais e Literários. Ano I, nº 1 (Maio de 1934) ao Ano II, nº
24 (Abril de 1936); Propr.
e Director: Cunha Leal; Editor e
secretário da redacção: Victor Júdice da Costa; Admin: António Casanovas Augustine; Redacção: Rua Cidade da Horta, nº 19, 1º, Lisboa; Redactor Principal: Vasco da Gama
Fernandes; Chefe da Redacção: Álvaro
Machado; Impressão: Tipografia “A
Renascença”, Lisboa (Imprensa Lucas & C.ª, Lisboa); 1934-36, 24 numrs
Colaboração: Abel Salazar, André Brun, Almada Negreiros, Almerindo Lessa, Álvaro
Marinha de Campos, Armando Cortesão, Aquilino Ribeiro, Campos Lima, Carlos
Amaro, César Ferreira, Cunha Leal, Fidelino de Figueiredo, Germano Rocha,
Henrique Vilhena, Hipólito Raposo, José Lopes, Lobo Vilela, Manuel
Maria Coelho, Moura Vitória, Nuno Rodrigues dos Santos, Pimenta da Castro, Salvado
de Carvalho, Sebastião Ribeiro, Severo Portela, Vasco da Gama Fernandes
“A revista Vida Contemporânea
surgiu em Maio de 1934, ano marcado por eventos dramáticos em Portugal: a Revolta
de Marinha Grande em 18 de Janeiro, a entrada em vigor da Constituição de 1933 e
a realização das primeiras eleições, em 16 Dezembro, para a Assembleia Nacional.
Perante estes momentos iniciais a consolidação do Estado Novo, a oposição ao regime,
dividida e cada vez mais enfraquecida pela repressão, parecia mostrar-se incapaz
de inverter a marcha dos acontecimentos propícia ao salazarismo nascente (…)
(…) O proprietário e director
era o engenheiro Francisco Pinto Cunha Leal (1888-1970), chefe de ministério na
Primeira República, antigo reitor da Universidade de Coimbra e opositor ao
Estado Novo. O periódico nasceu na sequência do regresso de Cunha Leal de um
dos seus exílios, resultantes justamente das actividades contra o regime
político, institucionalizado com a Constituição de 1933. Esteve exilado desde
1930 na Galiza (Corunha), onde estabeleceu uma forte amizade com o líder
nacionalista galego e futuro chefe do governo espanhol, Casares Quiroga. Aproveitaria
a amnistia de finais de 1932 para regressar a Portugal e lançar a Vida Contemporânea,
no conturbado ano de 1934 (…)
(…) O projecto educacional da revista torna-se um elemento de
mobilização das elites da oposição, devido ao seu impacto cultural na sociedade
portuguesa da época. Em 31 de Janeiro de 1935 realiza-se um almoço de
confraternização, no Hotel Avis, com o objectivo explícito de organizar uma
estrutura cultural destinada a propagandear as ideias de instrução pública. A
expulsão, em Maio de 1935, de Francisco Pinto da Cunha Leal para Espanha, pelo governo
do Estado Novo, esteve ligada à sua participação na falhada intentona, desse mesmo
mês, em ligação com republicanos e nacionais sindicalistas (…)"
[LER MAIS AQUI - Júlio Rodrigues da Silva, “Cunha Leal e a Vida Contemporânea (1934-1936)” - sublinhados nossos]
“A
alma portuguesa caracteriza-se por uma doentia sensibilidade, que se manifesta
por formas aparentemente contraditórias: por um lado, a exaltação hiperbólica
das glórias do passado; por outro lado, a apreciação pessimista das misérias do
presente. Somos como os velhos fidalgos excessivamente maltratados pelo
destino, que se comprazem em exagerar a grandeza da sua queda, fazendo para
isso subir a nível do ponto donde vieram e baixar o nível do ponto aonde
chegaram. Somos ainda como o mendigo que, ao receber do transeunte parcamente
caritativo a magra esmola, tem uma chama estranha a iluminar-lhe as pupilas e
lhe diz com voz rouca e misteriosa: Ah! Se o senhor pudesse adivinhar o homem
que eu já fui!
Há
uma explicação plausível para êste modo de ser espiritual. A nossa história
tem, como as histórias dos outros povos — nem mais, nem menos do que elas —
altos e baixos, acções nobres e acções reles, façanhas heróicas e manifestações
de poltronaria. Quiseram, porém, os fados que a trajectória portuguesa tivesse
influenciado sobremaneira a evolução da civilização mundial e que, em grande
parte, os nossos empreendimentos colectivos não estivessem em proporção com a
nossa capacidade material, com as nossas possibilidades práticas de execução.
Desta maneira, a história de Portugal surge como um fogacho, que se erguesse
muito alto para logo quási se extinguir. Isto criou em nós a propensão para os
sonhos épicos e para os contrastes bruscos da suma grandeza e da suma miséria.
Assim,
pois, falta-nos equilíbrio espiritual e bom senso — qualidades aliás muito mais
raras do que se supõe. Um exame de consciência, mesmo superficial, deve
convencer-nos disso. Um grande esfôrço intelectual pode fazer-nos adquirir o
sentimento das proporções, a noção das realidades universais, condição
indispensável para que sejamos mais comedidos em quebrar a paz e sossêgo de que
gozam nos sarcófagos das catedrais os 'barões assinalados' dos tempos idas e
para que possam tornar-se menos desageitados e mais eficientes os homúnculos
fabricados em série pela fraqueza genética da era contemporânea. Oxalá as
gerações presentes e futuras ousem lançar ombros à obra de resgate espiritual e
de renovação material, requerida imperativamente pelas circunstâncias! (…)"
[Cunha Leal, in “No Começo da Nossa Viagem", Vida
Contemporânea, n.º 2, Junho de 1934 - sublinhados nossos]FOTOS via FRENESI
J.M.M.
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