quinta-feira, 9 de setembro de 2010

SIDÓNIO PAIS E OS SETE PILARES DO FUTURO - ANTÓNIO TELO


"[Sidónio Pais é uma experiência política pioneira, não só para Portugal como para a Europa do Sul. No sidonismo estão os elementos que vamos reencontrar em dezenas de regimes autoritários ou ditatoriais da Europa e América entre 1919 e 1945]

O sidonismo é uma resposta à longa crise do Estado liberal. Em termos simples, as razões desta são as dificuldades da transição entre as democracias liberais e elitistas do século XIX para as democracias de massas do século XX. Nas primeiras, só cerca de 10 por cento da população adulta participa na vida política (vota), enquadrada por partidos de elites que são viveiros de quadros e de caciques. Nas segundas, a participação política (voto) está alargada a 80 por cento da população adulta, enquadrada por partidos de massas.

As democracias de massas só podem funcionar de forma estável em sociedades urbanizadas, com a maioria da população letrada, com uma classe média numerosa e um ensino superior desenvolvido. Nas primeiras décadas do século XX, a Europa do Sul não conhece estas condições, nem sequer na Itália e muito menos em Portugal, pelo que não é possível criar ali democracias de massas estáveis. Ao mesmo tempo, neste período, as democracias elitistas do século XIX já não garantem a estabilidade e a paz social, porque a classe média urbanizada e letrada cresce, enquanto as classes baixas se organizam de diversas formas para defender o que consideram ser os seus direitos. Abre-se, assim, nas sociedades do Sul da Europa uma crise do Estado, um período de anormal violência social, com recurso frequente a confrontos armados, atentados, levantamentos, golpes, revoluções e guerras civis. O Estado, em resumo, deixou de garantir a paz social, a base de qualquer desenvolvimento. (...)

Sidónio Pais é uma tentativa de responder a esta crise, de repor a autoridade do Estado. A sua acção política pode ser resumida em sete pilares.

O primeiro é a valorização da Pátria, que surge como uma resposta à crise do Estado (...)

O segundo pilar é a valorização do papel do Estado como a única instituição que, apoiada nas Forças Armadas, pode salvar a nação em perigo. (...)

O terceiro pilar da acção de Sidónio é a valorização das forças armadas e de segurança como as únicas instituições com legitimidade para exercer a violência. (...)

O quarto pilar da acção de Sidónio é a valorização do papel do "chefe". O "chefe" é o Presidente, a cabeça do Estado, com autoridade e carisma, que suscita respeito e obediência. (...)

O quinto pilar da acção de Sidónio é a diferente função dos partidos, o que está ligado a uma nova noção da democracia. Para Sidónio, a legitimidade em período de grande crise vinha directamente do povo para o chefe, através do voto directo, sem os partidos de permeio (...) O partido era um instrumento do chefe, com uma acção virada para a aplicação da estratégia do Estado, para a salvação da Pátria. A materialização desta ideia só surge parcialmente com o PNR, o partido de Sidónio, subordinado ao chefe e apresentado como "nacionalista". Isto leva igualmente à organização da segunda câmara sidonista, uma precursora da Câmara Corporativa. (...)

O sexto pilar da acção de Sidónio era a tendência de ultrapassar as diferenças tradicionais da sociedade liberal portuguesa, a começar na dicotomia entre República e Monarquia. Toda a acção de Sidónio se baseia na ideia de que o importante para a nação não é a forma de escolha do seu representante máximo, mas a sua ligação aos interesses nacionais, o que tem a ver principalmente com a estrutura e a acção do Estado. O que interessa, em resumo, não é se o Estado é monarquia ou república, mas sim qual a sua função social e autoridade.

Sidónio reafirma sempre o carácter republicano do regime, mas não hesita em apoiar-se fortemente nos monárquicos, não só porque eles eram necessários no equilíbrio de forças existentes, mas também porque, para ele, a questão do regime estava ultrapassada, tinha deixado de ser importante perante os reais problemas da sociedade. (...).

O sétimo pilar da acção de Sidónio é a recuperação dos valores tradicionais da sociedade. Em certo sentido, ele já está contido nos outros: a reforma da instituição militar é feita em nome dos valores da ordem, da disciplina, da hierarquia; a mudança da relação com a Igreja é feita em nome dos valores da fé, da esperança, da caridade, elevada também ela a uma acção directa do Estado.

A "ordem" é, para Sidónio, o mais importante dos valores tradicionais, aquele que o Estado se deve empenhar em assegurar como a menina dos seus olhos. Mas Sidónio vai mais longe: tem uma acção a favor dos valores familiares, a favor do papel tradicional da mulher, a favor da moral, contra o aumento da prostituição que a guerra trouxe consigo, contra a ostentação de luxo dos especuladores e dos novos-ricos. Tem igualmente uma acção a favor do mundo rural e tradicional, de valorização da terra e do trabalho agrícola como o berço da tradição - é nas aldeias que vivem os valores nacionais, diziam os sidonistas. (…)

O génio político de Sidónio, que o transforma num precursor e num pioneiro numa escala global, foi ter encontrado a fórmula que muitos outros aplicariam com infinitas variantes nas décadas vindouras - e essa foi a causa da sua grandeza e da sua tragédia” [LER TODO O ARTIGO, AQUI]

António Telo, Sidónio Pais e os sete pilares do futuro, in Jornal Público, 09/09/2010 - sublinhados nossos]

J.M.M.

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