domingo, 29 de janeiro de 2017

SANTOS CARDOSO (HENRIQUE JOSÉ DOS) – NOTA BREVE SOBRE UM DOS REVOLUCIONÁRIOS DO 31 DE JANEIRO DE 1891


 
Henrique José dos Santos Cardoso
 
Henrique José dos Santos Cardoso nasceu em Santa Comba de Vilariça, concelho de Vila Flor (distrito de Bragança) a 21 de Abril de 1842 [cf. Memórias do Abade de Baçal, tomo VII, p. 78; no Portugal Diccionario Historico, de Esteves Pereira e Guilherme Rodrigues, vol VI, p. 651, é referido o ano de 1843]. Era filho de João José dos Santos Cardoso e Teresa de Jesus, proprietários, naturais de Castro (concelho de Chaves).

Teve Santos Cardoso um filho [Henrique José dos Santos Cardoso], nascido no Porto a 3 de Novembro de 1870 e assassinado em Lisboa [“atingido pelas costas” por um tiro disparado quase em frente ao teatro de S. Carlos, na rua Paiva de Andrade, por elementos hostis ao Partido Republicano Português (refira-se que um dos presos, presumível coautor do crime, o operário do Arsenal Francisco Henrique de Morais, se suicidou na esquadra da travessa das Almas) quando se dirigia (juntamente com Alexandre Braga e Artur Costa) para a sede do PRP, para uma reunião do Diretório] em 28 de Fevereiro de 1915 [o seu funeral decorreu na cidade do Porto, estando presentes, na imponentíssima manifestação fúnebre para o cemitério do Repouso, inúmeros centros e grémios republicanos, vultos republicanos nacionais, entre eles o dr. Afonso Costa e Alexandre Braga]. Foi assistente de Química no Instituo Comercial e Industrial do Porto, desempenhou diversos cargos públicos e era deputado do PRP (eleito por Vila Nova de Gaia) na data do seu assassinato. Como seu pai, era um vigoroso republicano, jornalista (no jornal A Pátria), notável polemista e estimado bibliófilo.  

Henrique José dos Santos Cardoso (pai) foi barbeiro na sua terra natal antes de partir para o Porto, onde fixa residência [cf. Memórias do Abade de Baçal, ibidem] e estabelece o seu negócio, ao mesmo tempo que se torna um dos mais vigorosos jornalistas populares. De “hercúlea corpulência, as suas barbas infinitamente compridas, o seu grosso bengalão e, sobretudo, a virulência dos seus escritos, trouxeram por muito tempo aterrada a cidade do Porto” [ibidem].

Republicano (foi eleito para o Diretório do Centro Eleitoral Republicano do Porto, em 1878; participa, publicamente nas manifestações republicanas, presidindo mesmo a um comício anti-jesuítico no ano de 1888) e jacobino, é proprietário, fundador e redactor do periódico “A Justiça Portuguesa” [nº espécimen, 2 de Agosto de 1880 ao nº 727, de 25 de Junho de 1894 – suspendeu a publicação entre 16 de Janeiro de 1891 a Outubro de 1893; impresso na Typ. Alliança, depois na Typ Occidental, Porto], onde escreveu as mais “tenazes campanhas contra as instituições monárquicas” [Portugal Diccionario Historico, ibidem]. Tal atitude carreou-lhe inúmeros inimigos e a fama dos que professavam as “ideias avançadas” do republicanismo, apesar da maledicência e truculência que exercia nos seus escritos e na acção política [sobre esta questão em torno de Santos Cardoso, ver João Chagas & Ex-Tenente Coelho, “História da Revolta do Porto de 31 de Janeiro de 1891”, 1978, reed., p. 67-83; consultar, também, as diversas referências a Santos Cardoso em Guilherme Martins Rodrigues Sampaio, “A ideia federalista em Augusto Manuel Alves da Veiga 1850-1924”, obra de mestrado em História Contemporânea, FLUL, 2009), principalmente p.70 e ss.; consultar, ainda, o trabalho de Fernando de Sousa, A revolta de 31 de Janeiro de 1981]

Foi Santos Cardoso o “braço direito” de [Augusto Manuel] Alves da Veiga

[advogado, publicista, militante republicano federalista, fundador da primeira agremiação republicana do Porto (1876: trata-se do Centro Republicano Democrático do Porto, com sede na rua de S. Bento da Vitória, curiosamente no rés-do-chão da casa de habitação de Sampaio Bruno; refira-se que o Centro mudou de nome, passando a denominar-se Centro Eleitoral Republicano Democrático do Porto, em 1877, onde passou a pontificar Rodrigues de Feitas; aliás, Alves da Veiga foi o autor do seu “Manifesto” – sobre Alves da Veiga e o Centro Republicano, consultar, ainda, Guilherme Martins Rodrigues Sampaio, ob. cit.), importante maçon portuense e o chefe civil da revolta republicana do 31 de Janeiro de 1891],

tendo entrado com ele, no dia 31 de Janeiro de 1891, no edifico da Câmara Municipal, onde Alves da Veiga declara deposta a monarquia. Na verdade, foi (a partir de Agosto de 1890) na casa comercial do Santos Cardoso que muitos elementos da guarda-fiscal foram instruídos para a revolta republicana do Porto, aliciados pelo jornal “O Sargento” [Órgão dos Oficiais Inferiores do Exercito Português]. Diga-se que por detrás desse movimento republicano conspirativo estava João Chagas - que cedo compreendeu a importância moral e cívica de Alves da Veiga para coordenar a revolta - e o seu jornal “A Republica Portuguesa”. Por último, diga-se que terá sido o próprio João Chagas que “teve a ideia em Setembro (1890) de encarregar Santos Cardoso da agremiação dos sargentos – vide Guilherme Martins Rodrigues Sampaio, op. cit., p. 72].
 
   
Foi, portanto, Santos Cardoso um dos instigadores da revolta, um elemento valioso num certo período de tempo, muito embora com as limitações, demagogia, erros e a postura pouco moral - que lhe foi apontada por João Chagas, in História da Revolta do Porto de 31 de Janeiro de 1891, ibidem - e passe os termos depreciativos com que o virulento [Francisco] Homem Cristo [então tenente e chefe do Diretório Republicano de Lisboa, aliás líder da facção conservadora dos republicanos; Homem Cristo, que era contra a tentativa de rebelião do Porto, inclusive considerava-a como uma “provocação monárquica”, ao ponto de publicar no jornal “Debates” de 27 de Janeiro de 1891 um artigo em que atacava Alves da Veiga e Santos Cardoso, pedindo aos republicanos para que não dessem créditos aos dois – citado por Guilherme Martins Rodrigues Sampaio, op. cit., p. 79; idem por Fernando Sousa, ob. cit.] o apodou - como ter praticado actos cobardes e denunciando camaradas -, no seu livro “Os Acontecimentos de 31 de Janeiro e a minha prisão, Lisboa, 1891, que aliás carecem de ser confirmados.

Na brutal “ressaca” da revolta frustrada do 31 de Janeiro de 1891, de que resultou inúmeros mortos e estropiados entre os revoltosos, tendo que os melhores quadros republicanos sofrido pesadas humilhações entre o exílio (caso de Alves da Veiga, António Claro, Basílio Teles, Sampaio Bruno), a prisão e o degredo (João Chagas, Santos Cardoso, capitão Leitão, tenente Coelho e outros mais).

Santos Cardoso foi condenado, no conselho de guerra de Leixões a uma pena de prisão maior celular, por quatro anos, seguidos de degredo por oito. Pela amnistia de Fevereiro de 1893 regressou a Portugal e retomou o seu jornal, A Justiça Portugueza, agora fustigando os antigos correligionários.    

Escreveu Santos Cardoso: “Verdades de Sangue, com dois juízos críticos pelos Exmos Snrs. Drs Alves da Veiga e Pedro Amorim Viana (tem o retrato do autor), Porto, Tip. Ocidental, 1877, p. 92; “Verdades de Sangue. Escândalo Bancário, história dos acontecimentos da crise monetária e bancária de 1875 a 1877. Porto, Tip. de Alexandre da Fonseca Vasconcelos, 1878, p. 128 [ um anunciado 3º volume, não saiu].

Henrique José dos Santos Cardoso viveu algum tempo em Lisboa, regressando ao Porto quando a doença o atingiu. Morreu em Vizela, a 5 de Agosto de 1899.

J.M.M.

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