A IDEIA. Revista de Cultura Libertária. II Série, Outono de 2017, nº
81-83 (número triplo, Dezembro 2017); Director:
António Cândido Franco; Consultor
Editorial: Artur Cruzeiro Seixas; Editor Gráfico: Luís Pires dos Reys; Impressão: Europress; Lisboa;
2017, 320 p.
“A Ideia regressa em 2017 reafirmando a sua marca identitária
entre as publicações portuguesas, até da área em que nasceu e se situa, através
da atenção que consagra ao surrealismo como “caso de estudo” mas também como
prática actuante e “modo de vida”. Além dos documentos e dos textos que o
leitor pode encontrar neste número que se prendem com o conhecimento activo desse
movimento e das suas figuras portuguesas, republicamos na secção “Leituras
& Notas” o editorial do número duplo 30/31 d’ A Ideia (Outono, 1983),
consagrado à criação picto-poética e que contou com o empenho de Mário Cesariny.
Escrito e publicado há 34 anos, o texto não assinado mas redigido por Miguel
Serras Pereira mostra a continuidade entre o passado e o presente desta revista
e ilustra a seu modo o entusiasmo que desde há muito votamos ao surrealismo e
às suas aspirações indeléveis de liberdade, de amor, de imaginação e de poesia.
Um século depois da revolução russa de 1917, com certeza o
evento que mais marcou o desenvolvimento da história mundial no século XX,
pareceu-nos indispensável, mais ainda numa publicação que teve como referencial
de origem a cultura operária, reflectir sobre este acontecimento com as
perspectivas e as ideias que nos são próprias. Ao longo das várias secções
deste volume apresentamos um conjunto diverso de materiais sobre o evento, uns
amplamente divulgados internacionalmente, mas deficientemente conhecidos entre
nós, como os respeitantes à figura de Nestor Makno e aos sucessos de Cronstadt
de Março de 1921, outros quase desconhecidos, como os que documentam o impacto
da revolução russa na imprensa operária portuguesa da época – e numa altura em
que o jornal A Batalha ainda juntava Bakunine, Kropotkine, Lenine e Trotsky.
Neste capítulo, além dos estudos de Paulo Eduardo Guimarães e Gabriel Rui
Silva, chamamos a atenção para o levantamento feito por António Baião,
incidindo na revista A Sementeira, barómetro afinadíssimo dos eventos russos então
em curso. Cumpre destacar a figura do operário caldeireiro Hilário Marques,
director da publicação, de quem se republicam alguns dos editoriais então dados
à estampa. São peças notáveis de independência, de espírito crítico e de
perspicácia analítica, valores aliás comuns ao escol operário da época, formado
nos valores emancipadores do sindicalismo libertário e todo notavelmente
auto-didacta.
Por fim queremos assinalar a republicação do texto de José Pedro
Zúquete, publicado pela primeira vez na revista Análise Social (n.º 221, vol.
LI, 4.º trimestre, 2016, pp. 966-989), não por estarmos de acordo com tudo o
que diz – estamos longe até dalguns enfoques – mas por nos parecer que pela
primeira vez, ao menos nos tempos mais recentes, um texto exterior ao
movimento, escrito por um jovem politólogo, a quem agradecemos a autorização
que nos deu para reproduzir e comentar o seu trabalho, mostra um genuíno
interesse pela história das nossas ideias e um rico e actualizado acervo de
informações sobre uma parte do anarquismo contemporâneo, podendo assim
tornar-se num ponto de reflexão interna. Daí o pedido que fizemos a dois
históricos da revista, João Freire e Jorge Leandro Rosa, para comentarem o texto,
que levanta porém questões – nas relações do anarquismo com a violência – que
os dois comentários aqui publicados, que só comprometem os autores, não esgotam.
É pois possível que a ele regressemos em próximo número. Os libertários
bateram-se por uma sociedade livre e sem coacções e por isso há 100 anos não
puderam seguir os rumos da revolução russa. Continuam hoje a desejar uma sociedade
livre e cooperante, sem coacções, sem guerras, sem violências e por isso não
podem aceitar a violência – a desobediência civil como Thoreau, Gandhi e Luther
King a praticaram, mesmo quando ilegal, valendo por isso aos seus autores a
cadeia, é eticamente irrepreensível – como ponto de partida da sociedade a que
aspiram” [in Limiar, p. 7, da revista].
[Alguns Anotações Nossas]: António
Baião [A Revolução Russa na Imprensa Operária e Libertária da I República -
bibliografia], António Cândido Franco [Henry David Thoreau e a Moderna Tradição
Libertária], [Conversa com Cruzeiro Seixas], [Correspondência de Fernando Alves
dos Santos para Cruzeiro Seixas], [Correspondência de Luiz Pacheco para
Fernando de Paços], [Correspondência Mário Cesariny/Natália Correia], Dossier
Portugal Surrealismo, Emma Goldman [Recordações de Kropotkine], Gabriel Rui
Silva [Manuel Ribeiro, Eduardo Metzner e a Revolução Russa de 1917], [Memorial
de Cronstadt], Fernando J. B. Martinho [Virgílio Martinho: Poeta], Hilário
Marques [Editoriais D’A Sementeira], Jaime Brasil [A Rússia dos Sovietes], Jaime
Salazar Sampaio [textos … inéditos], João Freire [A Acção Anarquista Hoje e há
um Século], João de Sousa [poema], José Maria Carvalho Ferreira [Contradições e
Equívocos Históricos da Revolução Russa], José Pedro Zúquete [O Anarquismo está
de volta?], Manuel da Silva Ramos [Baptista-Bastos Vivo e Indispensável], Miguel
Real [Virgílio Martinho entre o surrealismo e o neo-realismo], Paulo Eduardo
Guimarães [O Iconoclasmo Acrata e a Crise da Consciência Revolucionária em
Portugal nos Anos 20], Risoleta C. Pinto Pedro [Jaime Salazar Sampaio – O Homem
Drama].
J.M.M.
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