quinta-feira, 1 de março de 2007

ASSIM FALAVA EU ... POR ALFREDO PIMENTA


"Assim falava eu ...

... julgando interpretar o sentir da mocidade académica que produziu espontaneamente as retumbantes manifestações de 29 de Fevereiro. E na verdade parecia bem que dessa geração académica, que se liquidou miseravelmente meses depois, ia sair o grande movimento redentor desta nacionalidade, a reforma integral do ensino, a mudança completa nos costumes universitários e, porventura, uma profunda transformação nos nossos costumes políticos! Viu-o o Presidente do Conselho, João Franco Castelo Branco. Nos seus discursos deixava transparecer claramente o receio de que o movimento académico, triunfante, o derrotasse. E por isso lançou mão de todas as baixezas, de todas as vilezas, de todas as delações, de tudo quanto um cérebro doentio e um carácter anódino se pode servir para conseguir fins condenáveis. A cena que o Governo desempenhou no Parlamento, os gestos grotescos e os discursos parvos do lente Teixeira d'Abreu, a subserviência imbecil da maioria, e as campanhas caluniosas do órgão do Governo; a atitude policial do reitor João d'Alarcão, a submissão do professorado de Direito, ou antes, (porque não?) de todo o professorado universitário onde houve apenas uma excepção gloriosa, a do Dr. Bernardino Machado; tudo isso a que assistimos durante longos três meses, é a prova inegável do temor que invadiu as esferas governativas, perturbando-as e desorientando-as. Vendo isso, as nossas esperanças aumentaram. Dizia João Franco que nós queríamos a queda do Governo. Não. Mas se o Governo caía por nossa causa, havíamos de abandonar o movimento? De modo nenhum. Caísse o Governo, Caísse a monarquia, mas salvasse-se uma geração inteira que pesa mais nos destinos de um país que um Governo de idiotas, ou uma monarquia de incapazes. As nossas vistas eram mais largas. E à medida que caminhávamos o nosso sonho era maior"

[Alfredo Pimenta, in Factos Sociais: problemas d'hoje, Porto, 1908]

J.M.M.

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