terça-feira, 14 de agosto de 2007

TRINDADE COELHO (Parte II)




Ao longo de toda a sua vida Trindade Coelho vai escrevendo e publicando com regularidade. Conhecem-se alguns pseudónimos por si utilizados nos diferentes periódicos onde colaborou, entre os quais: Cojo Elhose, Belisário, Ch. A. Hysson, entre outros.
No início da sua vida literária enviou um manuscrito à Associação de Jornalistas de Lisboa que acabaria por ser premiado, o que lhe abriu alguns caminhos no desenvolvimento da sua vida jornalística e literária durante o século XIX.

A sua obra-prima, Os Meus Amores, foi publicada em 1891. O segundo livro mais conhecido, In Illo Tempore, uma espécie de livro de memórias da vida estudantil de Coimbra, sai em 1902. Dedica parte importante da sua obra à produção de opúsculos de carácter jurídico, doutrinário, cívico e pedagógico. A educação do povo merece-lhe uma série de folhetos. Em 1902 escreve uma Autobiografia, dedicada a uma amiga de Hamburgo, Louise Ey. Este texto dá-nos pistas para a compreensão tanto da sua vida como do seu carácter e também da sua obra. Só seria publicada em livro em 1910, num volume que incluía também alguma epistolografia, mas passaria a integrar Os Meus Amores a partir da 9ª edição.

Trindade Coelho pertence ao grupo de cultores do chamado conto rústico, com alguma tradição na literatura portuguesa do séc. XIX e ainda no séc. XX. O seu protótipo em Portugal é O Pároco da Aldeia, de Alexandre Herculano. A defesa da matriz rural do nosso país, que se opõe, em parte, aos excessos do positivismo filosófico, idealizando a vida tranquila do campo como alternativa à vida desumana das grandes cidades. Segundo se conseguiu apurar o seu autor favorito era Pierre Loti (1850-1923), autor francês que traduziu para a Gazeta de Portalegre.

O seu livro mais conhecido, Os Meus Amores, é daquelas obras que continua a editar-se e a ler-se, mesmo nos nossos dias. Consta de uma colectânea de contos que marcaram a Literatura Portuguesa. Trata-se de um conjunto de quadros descritos de forma simples e acessível a todos. Alguns textos marcam pela emoção com que o autor os descreve, o que induz facilmente a empatia do leitor.

Nos escritos de Trindade Coelho encontram-se diversas referências à sua região e às terras onde cresceu. Em A Minha Candidatura por Mogadouro (Costumes Políticos em Portugal), onde recorda a tentativa do ministro da Justiça para o convencer a aceitar ser deputado por Portalegre.
Num dos seus Folhetos para o Povo intitulado Loas à cidade de Bragança, para que não dê o seu mando senão aos seus filhos, exortando esta cidade a que não se submeta a Vila Real. Trindade Coelho coloca-se do lado dos que defendiam no Jornal de Mirandela, de 10 de Novembro de 1900, que em Bragança se deve fazer política «com os seus vizinhos (vizinhos da porta: o contrário de vila-realenses) e nunca com os adventícios [inimigos da sua terra] (os tais marinheiros do couraçado Aléu)», numa referência a Teixeira de Sousa que era natural de Vila Real.

Pertenceu à Maçonaria, tendo sido iniciado em 1906, pertenceu à loja Solidariedade de Lisboa com o nome simbólico de Renovador.

Lourenço Cayola, que com ele conviveu e trocou algumas cartas, descrevia-o da seguinte forma: De estatura um pouco baixa, peito largo, cara redonda, bigode farto, olhos muito luminosos, mas com o brilho embaciado pelo uso constante da luneta e uma voz de trovão, a primeira impressão que se colhia ao fitá-lo, não era das mais agradáveis. Trocadas porém com ele algumas palavras essa impressão desvanecia-se e substituía-a uma outra inteiramente diferente.

Por seu lado, António Cabral recorda: Veio o ano terrível de 1907. O ministério presidido por João Franco tinha entrado, para desgraça do País, em aberta ditadura, tão estéril como violenta, a que pôs termo o assassínio vil do grande rei D. Carlos e do malogrado Príncipe Real, D. Luís. Em 21 de Novembro desse ano de 1907, foi publicado o decreto que sujeitava os processados políticos à alçada do juiz criminal, para serem julgados pela lei de 13 de Fevereiro de 1896, contra os anarquistas – a lei celerada, como lhe chamavam os avançados.
Trindade Coelho não se conformou com esta determinação governativa. Para não ter que a aplicar, como agente do Ministério Público, pediu a demissão do seu cargo, sem olhar a interesses pessoais, sem considerar que o seu lar ficava sem o pão de todos os dias. Confiava, o pobre ingénuo, em que lhe viria a ser dada a devida reparação …Sempre fantasista e crédulo! … Nunca lha deram.


Num domingo, pelas cinco horas da tarde, no quarto andar do nº 20 da Rua de S. Roque, em Lisboa, Trindade Coelho suicidou-se com um tiro de revólver no coração. Aos 47 anos desaparecia um dos grandes valores da literatura portuguesa dos finais do século XIX que ainda hoje permanece algo esquecido.

Porque não recordar Trindade Coelho no centenário da sua morte que se assinala no próximo ano de forma condigna, ou na sua terra natal (Mogadouro) ou com iniciativas dos Departamentos/ de Literatura das Universidades Portuguesas?
Sabemos que está em preparação um estudo do Prof. Hirondino Fernandes sobre Trindade Coelho, onde se publicará alguma correspondência do escritor acompanhada de importantes apontamentos bio-bibliográficos, na senda do trabalho que este investigador apaixonado pelos autores do distrito de Bragança tem vindo a desenvolver ao longo de décadas. Ficamos à espera de outras novidades neste domínio.

[a continuar]

A.A.B.M.

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