quarta-feira, 5 de setembro de 2007

FERNÃO BOTTO MACHADO NO PARLAMENTO


"... dizem que eu sou anarquista. O que eu sou acima de tudo, é um grande crente e um grande idealista. Anarquista não o sou, porque infelizmente não o posso ser.

O tipo ideal do anarquista é um tipo tão superior, tão bom, tão abnegado, tão altruísta, tão perfeito, que bem longe de estar já à face da terra, é incompatível com a actual psicologia humana, e só pode resultar pela evolução da raça, pela instrução e educação lentas e pelo refinamento de psicologias e psicologias sucessivas, duma espécie bem superior à actual ..."

[Fernão Botto Machado em discurso parlamentar, citado in "Fernão Botto Machado”, de Abílio Mendes do Amaral, sep. Notícias de Gouveia, 1965-68, pp. 44 - sublinhados nossos]

"Sr. Presidente: tendo apresentado, ha dias, á Constituinte um projecto de Constituição, que tem pelo menos a vantagem de não ser a copia servil de qualquer outra, fui beber uma grande parte do meu estudo á Republica romana, e, principalmente á fonte inexaurivel que foram as republicas gregas e a grande democracia dos tempos de Demosthenes. E, ao fazer esse estudo, eu fiquei maravilhado com o respeito que então se tributava á liberdade individual, e o altissimo sentimento que defendia a personalidade humana. Vi então que longe de se proceder como entre nós, onde cada detentor do poder e da autoridade faz da liberdade uma rodilha, e da personalidade humana um capacho a que limpa os pés, essa extraordinaria democracia tinha chegado a um grau de cultura e civilização não attingido ainda hoje por qualquer democracia moderna.

Lá, entendia-se, e muito bem, que a liberdade era o dom mais precioso do homem, e que eram os bens e não o corpo, que deviam responder por delictos, transgressões ou contravenções. Antes de condemnados por sentença, só os exactores da fazenda infieis ou os parricidas entravam na cadeia. Criminoso, ou presumido criminoso, que tivesse bens suficientes para responderem pelas suas faltas ou que offerecesse tres fiadores idóneos, não entrava na cadeia preventivamente. Entre nós, é o que se tem visto. Cada autoridade permitte-se o direito de dispor da liberdade do cidadão como cousa despresivel. Não pode nem deve continuar assim, sob pena de a Republica atraiçoar a sua missão.

Se a melhor lei é a, que facultar menos arbitrio, a melhor autoridade é a que menos se approveitar do arbitrio que a lei lhe confere. Mas entre nós, na maioria dos casos, as autoridades, paraphraseando Luiz XIV, em regra dizem: a lei sou eu! Não pode ser, e não ha de ser, pelo menos sem o meu energico protesto"

[Fernão Botto Machado na sessão parlamentar de 4 de julho de 1911 - sublinhados nossos]

J.M.M.

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