sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

A DERROCADA DE UM TRONO (I)


A Derrocada de um Trono (I)

" ... Entrou enfim o ano de 1908, que se iniciou (...) pela destituição das vereações municipais. Pelo que, anteriormente ficou indicado é fácil de supor o estado de tensão em que os espíritos se encontravam. A revolta estava latente e tudo fazia prever um grave acontecimento.
Em começos de Janeiro o dr. Júlio de Vilhena dizia no seu Popular: - «O final de tudo isto ha de ser uma revolução ou um crime!
Nos jornais progressistas e designadamente no Correio da Manhã, a oposição à ditadura era áspera e ameaçadora. O Dia, órgão dos dissidentes, não era menos enérgico. Mas a espada de Democles da lei de 20 de Junho, do ano anterior, lá estava sempre alçada como perpetua ameaça aos jornais que discordassem do que se estava passando.
Os periódicos republicanos eram os mais moderados, visto que sobre eles se exercia mais opressora vigilância, mas, usando de subterfúgios vários, iam sempre mantendo o espírito público em profunda rebelião.

No dia 12 deste mês deu-se um episódio que ridicularizou bastante a ditadura. Aquele estudante Aquilino Ribeiro, que fôra preso por ser apanhado na casa da rua do Carreão, onde rebentara uma bomba de dinamite conseguiu fugir da esquadra do Caminho Novo, em que o tinham muito bem guardado.
Foi motivo de grande satisfação para todos os liberais.
Apesar desse percalço a policia não dormia. Por intermédio dos seus espiões, que era uma nuvem, descobrira o plano da premeditada revolução, e no dia 21 foram presas os srs. João Chagas, Alfredo Leal, Vitor de Souza e outros, e no dia seguinte o mesmo sucedeu ao sr. dr. António José d'Almeida, que era então o secretário do Directório do partido republicano.

Como os jornais franquistas afirmassem que se tinha descoberto um complot contra a vida de João Franco, o Directório do partido republicano fez espalhar por Lisboa, no dia 26, um curto manifesto em que dizia, principalmente, que: - «o diretorio republicano julga necessario, neste momento de tanta sobreexcitação, declarar bem alto, em contraposição aos ditadores, que o que ele, com o seu partido, quer, é suprimir opressões e não os homens do regime».

Apesar de se sentirem descobertos os organizadores da projectada revolução insistiam em sair com ela, designando para esse fim a noite de 28 para 29, mas, um pouco antes da hora marcada, a polícia assaltou o elevador da Biblioteca, que era d'onde devia partir o sinal, e prendeu aí os dissidentes visconde de Ribeira Brava e dr. Egas Moniz e os republicanos dr. Afonso Costa e tenente Álvaro Pope.

Em diversos pontos da cidade foram também presos alguns populares, encontrados em grupo, e no Rato travou-se renhido tiroteio entre homens do povo e polícias, resultando ficarem seis destes feridos e um morto.
Já a ditadura tinha nas mãos a prova de que se tentara realizar uma rebelião armada, e ia portanto tirar a represália.
E como seria ela? Temia-se que fosse terrível, por isso todos ficaram em dolorosa expectativa.

[continua]

in Cronica do Reinado de D. Carlos. A Derrocada de um Trono, de César da Silva, Lisboa, Romano Torres, 1922

J.M.M.

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