quinta-feira, 24 de abril de 2008

IN MEMORIAM DE FRANCISCO MARTINS RODRIGUES (1927-2008) - I PARTE


Nasce Francisco Martins Rodrigues [FMR] em Moura a 14 de Novembro de 1927. Seu pai foi oficial do exército [de onde foi expulso por ser oposicionista ao governo] e sua mãe era filha de pequenos proprietários de Moura [cf. entrevista de FMR, 25 de Agosto de 2004, a Carlos Morais]. Tinha mais cinco irmãos [cf. Público, 23 Abril de 2008], sendo o mais novo da família o pintor João Rodrigues. Face à situação económica difícil, a sua família muda-se para Lisboa [tinha FMR sete anos], encontrando aí o seu pai emprego e sustento. Estuda FMR até ao 6º ano do liceu, empregando-se depois numa livraria [durante 4 anos]. Posteriormente, vai trabalhar [1949] como "aprendiz de mecânico", na TAP [cf. Carlos Morais], onde permanece dois anos.

Em 1949 adere ao MUD [Movimento de Unidade Democrática] Juvenil, tendo sido preso [3 meses] e levado para o Aljube, quando se manifestava numa concentração contra a NATO, na avenida da Liberdade. Por isso mesmo é expulso da TAP. É libertado [1951], arranja emprego num estabelecimento de venda de frigoríficos [ib. ibidem], mas passa depois a dedicar-se totalmente ao activismo e à militância política no MUD Juvenil, ficando na sua Comissão Central e participando na campanha de Ruy Luís Gomes. É no MUD Juvenil que conhece o médico João Pulido Valente, que na altura tinha a missão de angariar fundos para a organização. É de novo preso [Maio de 1952], agora como "dirigente e funcionário" do MUD Juvenil, por ter feito pichagens e panfletos contra uma reunião da NATO, que iria decorrer no IST. É libertado condicionalmente e em Novembro, do mesmo ano, volta a ser detido, por fazer "campanha contra a vinda a Lisboa do general Ridgway, o criminoso da guerra bacteriológica na Coreia" [ib.ibidem], sob denúncia de um trabalhador da tipografia onde eram feitos os panfletos. Curiosamente, a tipografia ficava na mesma na rua da sede da PIDE, a António Maria Cardoso. Dadas as sucessivas prisões e o facto de viver com os pais, local de fácil acesso, levam-no a sair da sua casa, passando a residir em diferentes moradas e sob nomes falsos.

Em 1953 passa à clandestinidade, ingressando como funcionário do PC. Porém, como era "doente dos pulmões", o partido, por intermédio de um médico amigo, interna-o num sanatório para o necessário restabelecimento. É aí que passa quase todo o ano de 1954. Entretanto, na sua militância no MUD Juvenil tinha conhecido Maria Fernanda Alves, com quem veio a casar nesse mesmo ano de 1954 [sobre o papel das mulheres e companheiras durante a clandestinidade e o isolamento, ver a esse propósito "Clandestinas", 2004, de Ana Barradas, última companheira de FMR].

Em 1956, estava em Lisboa, "recuado" numa tipografia clandestina do partido, com mais cinco pessoas, entre elas o seu camarada Joaquim Carreira, secretária da célula e antigo operário de Marinha Grande [ib.ibidem]. Na altura produziam o material teórico sobre o XX Congresso do PCUS [que tinha decorrido a 14 de Fevereiro de 1956] e a consequente viragem [em resultado da tese da "coexistência pacífica", principalmente] operada pela então direcção do PCP. O próprio FMR [cf. Carlos Morais] nos diz que, desde logo, Joaquim Carreira entendia que tal documentação teórica lhe "cheirava a conversa social-democrata", pelo que chamaram um elemento da direcção do PCP para debater a questão. Júlio Fogaça [então membro do Comité Central] veio explicar a "viragem" política. Porém a saída nos jornais do famoso relatório Kruchev [onde Staline é acusado de crimes e atrocidades, bem como do culto da personalidade] instalou mais ainda a dúvida, quer no movimento comunista internacional [curiosamente a China Popular apoia o documento, para depois o criticar duramente. Enquanto isso o partido comunista italiano exigia uma “autocrítica” total sobre a construção do estado socialista na URS], quer entre os militantes comunistas portugueses, entre os quais estava FMR.

Durante um encontro, em Lisboa [1957], FMR é preso de novo, por denúncia, supostamente de um infiltrado no partido, e apanha três meses de prisão. Sua mulher é presa e levada para Caxias, onde nasce o seu segundo filho [cf. Público, ob. cit.]. FMR é levado do Aljube para Caxias e, posteriormente, para a cadeia de Peniche. Na prisão conhece vários dirigentes do partido, como Álvaro Cunhal, Francisco Miguel, Jaime Serra, e aí debate com os seus camaradas a "linha do partido", que acreditava se ter afastado da pureza do "leninismo".

No dia 3 de Janeiro de 1960 dá-se a conhecida e espectacular fuga da cadeia de Peniche, evadindo-se Francisco Martins Rodrigues, Álvaro Cunhal, Francisco Miguel, Joaquim Gomes, Jaime Serra, Pedro Soares, José Carlos, Guilherme de Carvalho, Rogério de Carvalho e Carlos Costa ["do interior a comissão de fuga era composta por Álvaro Cunhal, Jaime Serra e Joaquim Gomes. Do exterior, organizaram a fuga Pires Jorge e Dias Lourenço, com a ajuda de Octávio Pato, Rui Perdigão e Rogério Paulo" – ler aqui], mais o guarda que os auxiliou.

[a continuar]

J.M.M.

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