LIVRO: Crónica das Horas Vazias [Contém uma carta do autor a Marcello Caetano, então Ministro das Colónias];
AUTOR: Henrique Galvão [capa de Ribeiro];
EDITORA: Livraria Popular Francisco Franco, Lisboa, s.d. [1975], 148 p.
"Textos escritos na prisão (política), nos anos 50 do século XX, anteriores à fuga que levará Galvão a actos militarmente subversivos, entre os quais o sequestro do Santa Maria, navio da marinha mercante posto ao serviço de tropas para as colónias. Livro que reflecte o ódio do ex-servidor do Estado Novo a uma ditadura que ele próprio havia promovido. Uma azeda passagem menos “histórica”, mas nem por isso menos importante para a caracterização, hoje à distância, dos anos negros:
'[...] Ainda não podemos ler jornais mas já nos permitem a leitura de alguns livros: só aqueles que a Censura da cadeia tiver como inofensivos para o nosso espírito.
Quem exercerá as funções de Censor? O director da Cadeia nas horas livres dos seus cuidados de hortelão e criador de galinhas? O director da P.I.D.E. ou algum dos seus inspectores? Seja quem for, da casa, estamos sossegados. Os mais cultos pertencem àquela classe de analfabetos que sabem ler e escrever.
Nenhum livro dos que me enviaram me foi interdito. Tratava-se evidentemente de simples formalidade. A Censura não podia deixar de ser um dos órgãos da P.I.D.E. Tinha de assinalar a sua existência. O Estado Novo é um sistema de bolas chinesas: uma grande bola dentro da qual se contém e gira outra bola mais pequena, que por sua vez contém bolas, sempre menores e também cheias de bolas, até à insignificante e última que é maciça. No Estado Novo há um ditador e muitos ditadorzinhos concêntricos, uma Censura e muitas censurazinhas, uma Propaganda e muitas propagandazinhas, etc. Em Caxias gira uma das bolas interiores do sistema com o seu ditador, a sua censura, a sua polícia e a sua propaganda. [...]"
via FRENESI.
J.M.M.
Sem comentários:
Enviar um comentário