sábado, 1 de setembro de 2012

JOSÉ DO VALE (Parte II)


Desde 1896 que existem referências à actividade política de José do Vale. Ainda bastante jovem integrou a Associação de Classe dos Trabalhadores, que procurava agrupar os ajudantes dos operários da construção civil. Nessa altura próximo da facção socialista de Ernesto da Silva e contestando a direcção de Azedo Gneco no Partido Socialista.

A partir do ano seguinte e integrando o núcleo de colaboradores de A Obra, jornal de pendor intervencionista, revolucionário, passando em 1897 a pertencer à equipa de redactores deste jornal. Segundo Edgar Rodrigues, A Obra foi fundada em 9 de Julho de 1891, tendo como director inicialmente Guedes Quinhones, mais tarde J. Fernandes Alves e, posteriormente, Francisco Cristo. O editor do jornal era Francisco Maria Bandeira. Este jornal era o órgão dos carpinteiros civis e do operariado em geral. A redacção deste semanário situava-se na Rua da Barroca, 29, 1º, em Lisboa. Contou entre os seus colaboradores Heliodoro Salgado, Ernesto da Silva, Ribeiro de Azevedo, além dos anteriormente referidos. Este jornal evolui depois do socialismo possibilista para o anarquismo, anti-eleitoralismo e de tendência pró-republicana. Terminou publicação em 1906 [Edgar Rodrigues, O Despertar Operário em Portugal (1834-1911), Editora Sementeira, Lisboa, 1980, p. 275; Victor de Sá, Roteiro da Imprensa Operária e Sindical (1836-1986), Editorial Caminho, Lisboa, 1991, p. 81].

Em 1899, José do Vale juntamente com Heliodoro Salgado e outros activistas fundaram a Liga dos Livre Pensadores, tendo muitos deles estado na base da organização do Congresso Anticlerical que anteriormente referimos. Ainda devido à sua participação nesse congresso acabou por ser detido devido aos desacatos e desordens que ocorreram durante o mesmo. Nessa altura foi acusado de “vadiagem”. No ano seguinte volta a ser preso entre Março e Junho de 1901. Situação que veio a conhecer variadas vezes ao longo da sua vida.

Colabora, como redactor na revista Mocidade, revista mensal que se publicou em Lisboa entre 1 de Março de 1899 e Fevereiro de 1905. Numa edição de Cândido Chaves, contou com colaboração de Trindade Coelho, João de Barros, Luís da Câmara Reis, Álvaro de Castro, Cândido Guerreiro, Carlos Olavo, Alfredo Pimenta, João de Deus Ramos, Joaquim Manso, Ramada Curto, Tomás da Fonseca, Utra Machado, Campos Lima, Francisco Queirós, Pulido Valente, entre outros. Encontram-se três séries nesta revista, a primeira com 9 números; a segunda com 12 e a terceira e última, com 4 números. Uma das particularidades desta revista é contar com uma larga colaboração de Câmara Reis e de Álvaro de Castro [Daniel Pires, Dicionário da Imprensa Periódica Literária Portuguesa do Século XX (1900-1940), Grifo, Lisboa, 1986, p. 238-239]. Muitos dos colaboradores desta revista eram jovens estudantes, republicanos e anarquistas que viriam depois a assumir outras posições na vida política e cultural do País.

Em 1901, Bartolomeu Constantino e José do Vale, entre outros, organizaram a fundação da Federação Socialista Livre, onde Vale desempenhava as funções de secretário [António Ventura, A Carbonária em Portugal (1897-1910), Livros Horizonte, Lisboa, 2004, p. 53]. Publica-se também por essa altura aquele que viria a ser o órgão desta organização política: O Germinal. Esta federação volta a ser refundada em 1905 e mostra o fraccionamento que o movimento vivia nesse período, com anarquistas defendendo a revolução e a República como soluções para os problemas que se viviam no final do século XIX e início do século XX, em simultâneo outros grupos libertários que propunham soluções mais ou menos radicais.

José do Vale, entretanto, passa a viver como empregado do comércio e torna-se correspondente em Lisboa, do jornal portuense A Reacção, começando também a colaborar com A Vanguarda de forma regular, constando como redactor desse jornal desde Março de 1903. Nessa altura acompanhou uma missão de propaganda republicana ao Algarve que deram origem a um conjunto de artigos publicados nesse jornal em Agosto e Setembro de 1903 sob o título “Algarve Operário”.

Em Março de 1904, vamos encontrá-lo como membro do comité sul da Liga dos Livres Pensadores, organismo que deveria funcionar como elemento de ligação à Federação Internacional do Livre Pensamento. Foi um dos participantes na reunião realizada em Abril de 1904, na Associação dos Lojistas de Lisboa, onde se criticaram os acontecimentos ocorridos em Alcalá del Valle a 1 de Agosto 1903. Esta manifestação de pendor anarquista, na vizinha Espanha, provocou grande emoção entre os libertários e socialistas europeus. Em Lisboa, os acontecimentos foram difundidos pela Federação Socialista Livre, tendo, na ocasião discursado, para além de Sá Pereira, Magalhães Lima, Heliodoro Salgado, França Borges, Ramada Curto e José do Vale, entre outros.


Integrou, ainda em 1905, a Comissão do 2º Centenário de António José da Silva (O Judeu), que era constituída por Augusto José Vieira, Fernão Boto Machado, Carlos Cruz, Dâmaso Teixeira, França Borges, Joaquim Madureira, Luz de Almeida, Mayer Garção, Teófilo Braga, Magalhães Lima, Macedo Bragança, Israel Anahory, Martins Monteiro, Silva Fernandes, Sá Pereira, Fernando Reis e José do Vale.

Em 3 de Junho de 1907 teve início do julgamento de Magalhães Lima e José do Vale, do jornal Vanguarda, por crimes de liberdade de imprensa.

Segundo Armando Ribeiro, José do Vale foi contactado oficialmente através de carta enviada pelo próprio Ferreira do Amaral através de Bernardino Machado, para garantir que durante as exéquias fúnebres de D. Carlos não voltassem a existir atentados por parte dos núcleos de anarquistas intervencionistas [Armando Ribeiro, A Revolução Portuguesa, Edições João Romano Torres, Lisboa, 1915, p. 465-466]. Segundo contam outras fontes, José do Vale percorreu todos os núcleos anarquistas que conhecia na região de Lisboa, durante a noite para garantir que tudo decorreria de modo normal e foi isso que garantiu na carta que retribuiu a Bernardino Machado no dia seguinte e que viria a ser entregue ao conselheiro Ferreira do Amaral.

Durante o I Congresso Sindical e Cooperativista, realizado em 1909, em Lisboa, estabelece-se a ruptura entre sindicalistas e socialistas, saindo os sindicalistas anarquistas José do Vale, Constantino Martins, Denis de Morais, Alfredo Ladeira.

[Em continuação]

A.A.B.M.

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