terça-feira, 7 de julho de 2015

IN MEMORIAM MARIA BARROSO [1925-2015]


Leva-me onde as estradas me pertençam.
Porque as vozes viris que me conduzem
Ninguém, melhor do que eu, sabe dizê-las;
Porque eu não temo as livres solidões,
Onde habitam os ventos e as estrelas
.”
[Jaime Cortesão, “Ode à Liberdade”]

Maria de Jesus Simões Lopes Barroso, nasceu a 2 de Maio de 1925, na freguesia da Fuzeta (Olhão). A mãe, Maria da Encarnação Simões (nasceu em Coimbra), era professora oficial do ensino primário e o seu pai, foi o capitão do exército, Alfredo José Barroso

[1887-1970; nasceu em Montes de Alvor, Portimão; segue a carreira militar, nos regimentos de Tavira e Setúbal; republicano democrata e reviralhista, participa na revolta de Fevereiro de 1927 contra a Ditadura; é preso (por diversas vezes mais; a última acontece quando é detido pela PIDE em 1961, onde é severamente torturado), mantém as actividades conspirativas, tendo sido detido e deportado para o Forte de Angra do Heroísmo; passa à reforma no posto de capitão]

Maria Barroso frequenta o Curso de Arte Dramática do Conservatório Nacional, conclui o Curso de Teatro (1943), tendo sido figura de relevo em diversas peças teatrais de estimados autores (Frei Luís de Sousa, Garrett; trabalha na peça “Benilde ou a Virgem Mãe”, de Régio ou na peça “Casa de Bernarda Alba”, de Lorca), mas é demitida e afastada dos palcos, pela sua, determinada, oposição à ditadura do Estado Novo. As suas intervenções culturais, declamando poesia (os poemas do Novo Cancioneiro, estavam sempre presentes) e textos (com rara sensibilidade poética) em diversas associações (caso da Academia dos Amadores de Música) e reuniões públicas, tornavam-na persona non grata ao regime fascista. Em 1947, num sarau do “Grupo de Acção Cultural” (no Teatro Rosa Damasceno, Setúbal), ao ler poesias de intervenção social, é detida pela polícia política.

Entretanto frequenta (1944-45) o Curso de Ciências Históricas e Filosóficas da Universidade de Lisboa - onde conhece e casa (2 de Fevereiro de 1949) com Mário Soares, então detido no Aljube -, licenciando-se, em 1957, com a tese “Valentim Fernandes e a sua obra”. Nunca pode leccionar no ensino público (e privado), dado a sua proibição pelo governo de Salazar. Em 1961, dirige o Colégio Moderno (fundado por João Soares, seu sogro). A sua vertente de pedagoga (e de liderança) foi muito importante para fazer frente aos soezes e intolerantes ataques do salazarismo ao Colégio, e é um testemunho de gratidão de toda uma geração que por lá estudou e leccionou.  

Integrou o MUD, fez parte da Associação Feminina para a Paz, apoiou (e organizou) as campanhas presidenciais de Norton de Matos e Humberto Delgado, fez a campanha da CDE (foi candidata, em 1969, a deputada pelo círculo de Santarém). Em 1972, ao subscrever o manifesto “A Situação Política Portuguesa e o Fracasso do Reformismo” (logo apreendida pela PIDE) é de novo detida. Em 1973, integra a Comissão do III Congresso da Oposição Democrática, realizado em Aveiro, usando da palavra na sua sessão de abertura. No dia 19 de Abril de 1973, em Bad-Münstereifel (Alemanha) participa na fundação do Partido Socialista. O 25 de Abril de 1974 (dia tanto esperado) encontra-a, com Mário Soares, em Bona. Em democracia, foi deputada, pelo PS, á Assembleia da República pelos círculos do Algarve (1976) e Porto. E em 1985, com a eleição de Mário Soares à Presidência da República, desenvolve intensa actividade de apoio aos mais desfavorecidos e contra a exclusão social.
 
 
Funda a “Emergência Moçambique”, a “Associação para o Estudo e Prevenção da Violência, a Emergência Infantil” e a Pro Dignitate (Fundação para os Direitos Humanos e Contra a Violência), preside à Cruz Vermelha (1997-2003), é presidente honorária da UNICEF, e do mesmo modo, preside à Fundação Aristides de Sousa Mendes (2000).

Foi uma mulher independente, destemida, de grande ternura, tolerante, solidária e fraterna, lutadora contra as tiranias, uma mulher de causas, guiada por um entusiasmo e luz radiante, que a todos contagiam. Uma vida de coerência, verticalidade e verdade.

Morre a 7 de Junho de 2015.

J.M.M.

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