Viva o Dr. Afonso Costa (Seia, 6
de Março de 1871)
“Há três meses que domina em
Portugal, absoluta e olímpica, a Republica
nova do sr. Sidónio Pais. O que se tem passado durante este afadigado,
incerto e nevrótico consulado dava já para publicar volumes. Mas uma coisa
destaca, por entre todas, que desperta o pasmo e sobressalta os espíritos.
Refiro-me à situação dos presos
políticos que eu já tratei, em público, discursando, mas a que não posso deixar
de voltar mais uma vez.
Há republicanos que estão metidos
nos cárceres há três meses precisos. Qual o seu crime, a sua culpa, a sua
falta? Ignora-se. Alguns mal foram interrogados e só ultimamente; nenhum tem
processo instaurado; e, sendo a lei clara a respeito destes casos judiciários,
não se encontra, afinal, explicação razoável, para tamanho encarniçamento
contra cidadãos a que se não atribui ainda, com fundamento legal, o mínimo
delito.
A República que ai temos foi
feita por entre destroços e devastações para, disse-o o sr. Sidónio Pais,
restaurar em Portugal o império da lei. Mas a lei não foi instaurada, porque o que
impera é a vontade de um homem, tão pessoal e tão autoritário que supomos estar
em frente da de um rei absoluto.
O Pais sente-se mal desalentado e oprimido […]
Em Elvas, há precisamente três
meses, está encarcerado Afonso Costa. Refiro-me a ele em especial, não porque
a sua liberdade valha para mim mais do que a dos outros presos políticos, mas porque
contra o chefe do partido democrático se tomaram medidas mais despoticamente
severas.
Sobre ele recaíam as acusações
mais graves; era ele o alvo dos ódios mais acesos; dizia-se, sob a protecção das
autoridades e com aplauso delas, que a República, destes sete anos tinha sido
um regime de atentados e crimes e fazia-se de Afonso Costa o símbolo vivo
desses atentados e crimes. Mais uma razão, portanto, para lhe não taparem a
boca, deixando-lhe a liberdade de amplamente se defender.
Vem de longe esta lei moral: —
que ao acusado se não tolha a defesa, que parece ser um atributo sagrado
conferido ao homem pelos primeiros rudimentos da civilização.
Todavia Afonso Costa está, metido
no seu in-pace, onde não chegam os
rumores da vida social que o cerca. Ele é mais do que um proscrito dentro da
própria pátria; é uma espécie de morto dentro da própria vida. Têm-lhe atirado
para cima as acusações mais sangrentas e os epítetos mais degradantes. Ondas de
lama têm rolado sobre ele, cobrindo de podridão e de esterco a sua vida de
homem público. Mas ele não pode falar. Se ao seu cárcere tem chegado, alguma
vez, a notícia dessas torpes acusações à sua honra, ele tem curtido o desespero
de não lhes poder responder. Não foi bastante tirarem-lhe direito à liberdade;
também lhe tiraram o direito à vida moral, - o que de mais respeitável há no
homem …”
[António José de Almeida, in
jornal República, 9 de Março de 1918]
J.M.M.
1 comentário:
O tribuno e o legislador por excelencia,aqui já estariam de candeias às avessas..mas a admiração e a consideração eram mutuas..não se apaga uma amizade forjada na monarquia ..depois integraram um governo de Uniao Sagrada...por causa d Guerra
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